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Domingo, 05 de maio de 2024

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PEC 37: A PEC da legalidade... e da moralidade na investigação criminal

Pronunciei-me, da Tribuna da Câmara Municipal, durante a última Sessão Ordinária sobre a Proposta de Emenda à Constituição de número 37/2011, a famosa PEC 37.
Esta Emenda acrescenta o parágrafo 10 ao art. 144 de nossa Constituição, com a seguinte redação: “A apuração das infrações penais de que tratam os §§ 1º e 4º deste artigo, incumbem privativamente às polícias federal e civil dos Estados e do Distrito Federal, respectivamente”.
O Ministério Público, que se sente tolhido de uma atribuição que não lhe é conferida pela Carta Magna, numa campanha midiática e publicitária de contrainformação, ou melhor, de desinformação, que tem até logomarca e slogan (PEC da corrupção; PEC da impunidade, e outros besteróis sem lastro técnico ou retórico que o garanta em pé diante de um debate democrático), segundo a qual a aprovação da PEC 37 seria contrária aos interesses nacionais.
Veja-se, o inquérito policial, fase que antecede o processo penal, e onde ocorrem as investigações, está sob fiscalização do Ministério Público. Então, como permitirmos que atue na investigação justamente o órgão que a fiscalizará ao final?
Não é só. Nosso Código de Processo Penal não permite que o indiciado, investigado ou acusado produza provas. Vejamos: no artigo 6° do CPP, os incisos I, II e III muito pouco dizem a favor do investigado, quando impõem à autoridade policial, logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, o dever de tomar as seguintes providências: “I — dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado e conservação das coisas, até a chegada dos peritos criminais; II — apreender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos criminais e III — colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias”. Por sua vez, o artigo 14, do mesmo CPP, não obstante possibilite ao investigado requerer diligências, conclui, sem maior fundamento, por estabelecer que a diligência assim requerida “será realizada, ou não, a juízo da autoridade”.
É claro que os arts. 499 e 500 do Código em questão possibilitam que o acusado solicite diligências ao juiz da causa, mas isto só em sede de processo já instaurado!, quando, se deferida esta mesma providência ainda durante a fase de inquérito, seria possível que sequer processo houvesse.
Tenho muito apreço pelo Ministério Público, e não poucos amigos ali, que honram, em sua quase totalidade, os quadros que compõe o Parquet nacional.
No entanto, são homens. E, como homens, e mulheres, é claro, falhos. E é possível que alguns deles, até pela ânsia do poder da mídia, sejam seduzidos a selecionar seus alvos, definindo seus adversários e escolhendo suas vítimas ao sabor de opções que não têm caráter técnico, exatamente, como diz Neviton Guedes
É o que parece ter acontecido em dois casos recentes de atuação do Ministério Público, que põe nódoa em sua pretensa imagem de ÚNICO órgão imaculado da República.
O primeiro, no caso da operação Vegas da Polícia Federal, onde o Excelentíssimo Procurador Geral da República, senhor Gurgel, prevaricou ao engavetar um Inquérito Policial que investigava, dentre outros personagens da República, indivíduos como Carlinhos Cachoeira e o então Senador (e Promotor de Justiça) Demóstenes Torres, que só depois foram investigados na famosa CPI do Cachoeira.
No segundo caso, como concordar que este órgão possa efetivamente estar acima de qualquer suspeita, se este mesmo Procurador Geral só se lembrou de denunciar o Senador Renan Calheiros depois de 06 (seis) longínquos anos em que as peças informativas de investigação estavam em sua mesa, justamente quando o mesmo concorria à Presidência do Senado contra Senador Pedro Traques, um ex Promotor de Justiça?
Não estou aqui alegando conivência dos Senadores citados, mas as circunstâncias em que ocorreram tais fatos lançam suspeição insanável contra a atuação de alguns membros do MP. Diante de situações assim, seria este o órgão paladino dos princípios republicanos? Não concordo. Por isso, investigação pelo MP sem fiscalização ou controle externo é abrir o processo penal a abusos.
Além disso, deixar ao acusador o trabalho de coletar provas, quando ao investigado ou acusado não é dado igual direito, dignifica, pelo menos, retirar garantias individuais conquistadas pela nossa gente na Carta Magna de 1988.
Eu sou advogado militante na Comarca de Rondonópolis. Posso afirmar que já presenciei Promotores de Justiça pedirem, decentemente, a absolvição de acusados quando, durante o processo, convenciam-se da inocência dos mesmos. Mas eram, em sua maioria, acusados de menor potencial ofensivo. Existem casos policiais que migram das páginas do Inquérito para as bancas de jornal, ou para as telas de TV, ou sítios eletrônicos. Casos que ganham notoriedade, e que levam a opinião pública a condenar o sujeito antes do processo, e a impor-lhes a pena antes da sentença. Foi o que ocorreu com os proprietários daquela escola infantil na cidade de São Paulo, que foram injustamente acusados de molestar as crianças. Mesmo com a absolvição posterior, nunca mais conseguiram retomar suas vidas normalmente.
Será que em um caso como este, onde a opinião pública já esteja formada sobre a culpabilidade de uma pessoa, o promotor que é, repito, homem e falho, teria coragem de, ao investigar, coletar uma prova que inocentasse o indiciado, quando louros e aplausos da sociedade se lhe seriam lançados na hipótese de uma condenação? Não sei.
É justamente para que o inquérito não degenere nisto que o procedimento investigativo deve ser fiscalizado. O MP fiscaliza as investigações policiais. Quem fiscalizaria o MP? Enquanto isto não for adequadamente respondido, é temerário permitir que a sociedade fique à mercê de um órgão descontrolado. Devemos, sim, é aparelhar a polícia tecnologicamente, pagar melhores salários; treinar nossos policiais.
O Ministério Público, sob falsos argumentos alega duas inverdades: Primeiro, a de que se a PEC 37 for aprovada, todos os criminosos atualmente presos em resultado de investigações feitas pelo órgão serão postos em liberdade, como o Arcanjo Ribeiro, por exemplo. Isto é mentira. A regra que a PEC 37 altera é de processo penal, e não de Direito Penal, portanto, não retroage em beneficio do réu. Além disso, as provas colhidas durante as investigações do MP nestes casos já foram ratificadas em juízo, e, convalidadas, não podem mais ser alteradas pela aprovação da PEC em questão. Ninguém será solto, portanto.
Outra inverdade diz respeito ao anúncio do MP de que o GAECO acabaria. Mentira. O GAECO continuaria normalmente, tendo o Ministério Público agora não mais como membro integrante e sim como membro fiscalizador, o que é muito bom para o aperfeiçoamento do órgão, inclusive. Este argumento megalomaníaco do MP igualmente não prospera.
Sou favorável a que o Ministério Público investigue. Mas não sem critérios estabelecidos na Constituição ou em Lei. Casos de desídia policial, corrupção na Polícia, claro que devem ser investigados pelo MP.
A este respeito, o próprio STF se manifestou, em voto do Exmo, Ministro Gilmar Mendes, que trago à colação: “Convém advertir que o poder de investigar do Ministério Público não pode ser exercido de forma ampla e irrestrita, sem qualquer controle, sob pena de agredir, inevitavelmente, direitos fundamentais (...). No modelo atual, não entendo possível aceitar que o Ministério Público substitua a atividade policial incondicionalmente, devendo a atuação dar-se de forma subsidiária e em hipóteses específicas, a exemplo do que já enfatizado pelo ministro Celso de Mello quando do julgamento do HC 89.837”.
Filiando-me ao entendimento da Ordem dos Advogados do Brasil, e do Supremo Tribunal Federal, portanto, repudio o repúdio à PEC 37, esperando vê-la aprovada no Congresso Nacional.

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