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Segunda-feira, 29 de abril de 2024

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Viúva de vítima de intoxicação por chumbo não pode sacar crédito sem demonstrar necessidade

Sem demonstração de real estado de necessidade, viúva de vítima de intoxicação por chumbo não poderá levantar a importância de 60 salários mínimos do depósito existente nos autos. A decisão foi da Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, que deu provimento ao recurso da Anglogold Ashanti Córrego do Sítio Mineração S.A., cancelando, assim, a autorização que havia sido dada pela Justiça do Trabalho de Minas Gerais.

Para o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG), não havia impedimento para aplicar o artigo 475-O, parágrafo 2º, inciso I, do Código de Processo Civil (CPC). Esse dispositivo assegura o levantamento de dinheiro, em execução provisória, nos casos de crédito de natureza alimentar até o limite de 60 vezes o valor do salário mínimo, desde que o autor da ação de execução demonstre situação de necessidade.

Por se tratar de crédito de natureza alimentar decorrente da relação de emprego, o TRT da 3ª Região presumiu o estado de necessidade da autora e autorizou que ela sacasse, do depósito existente nos autos, o valor de seu crédito, observado o limite legal. No entanto, para a Sexta Turma do TST, que aplicou entendimento da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1), o estado de necessidade, nesse caso, não pode ser presumido.

O ministro Augusto César Leite de Carvalho, relator do recurso de revista, explicou que a SDI-1, em decisão de 17/2/2011, concluiu, por maioria, pela inaplicabilidade, na Justiça do Trabalho, daquele dispositivo do CPC. Apesar disso, o ministro ressaltou que restou uma possibilidade de aplicação, quando a SDI-1 sinalizou "no sentido de compreender que tal aplicação subsidiária do CPC somente se justificaria se revelado o estado de necessidade do credor de salários".

Esse foi o ponto que fez a Sexta Turma reformar a decisão regional. Conforme explicou o relator, diferentemente do decidido pelo Tribunal Regional de origem, não se pode presumir de forma absoluta o estado de necessidade da autora e dispensá-la da exigência de caução prévia para o levantamento do depósito. O TRT facultara à viúva, sem ter havido pedido dela, ou seja, ex officio, o levantamento do depósito. Nesse sentido, o ministro frisou que o inciso I do artigo 475-O do CPC dispõe que a execução provisória da sentença flui por iniciativa do exequente.

O relator destacou que para aplicar a exceção prevista no CPC em relação à dispensa de caução para o levantamento de importância de até 60, salários mínimos, cujos créditos possuem natureza alimentar ou são decorrentes de ato ilícito, "faz-se necessária a demonstração pela autora de que seu real estado de necessidade, ou seja, de que a sua subsistência ou de sua família, bem como naqueles casos de doença grave, depende do provimento jurisdicional".

Irreversível

O auxiliar de laboratório recebeu o diagnóstico de insuficiência renal crônica, com necessidade de diálise três vezes por semana, causada por contaminação pelo chumbo, em maio de 2002. No mesmo ano, ajuizou a reclamação, vindo a falecer em julho de 2008 aos 35 anos de idade, mas já estava doente gravemente desde os 29. Na inicial, contou que prestou serviços para a empresa no período de 10/3 e 15/10/1997.

Lá, exerceu atividades de lavagem de provetas e tubos de ensaios utilizados na análise do teor do ouro proveniente das minas da Mineração Morro Velho – a Anglogold Ashanti Córrego do Sítio Mineração S.A. foi a sociedade empresária que incorporou a Anglogold Ashanti Brasil Mineração Ltda, que já havia incorporado a Mineração Morro Velho Ltda.

Uma das substâncias utilizadas para a análise do ouro era o chumbo em pó, que ficava suspenso no ar, contaminando o empregado através da respiração e da absorção pela pele, causando-lhe doença profissional que atrofiou os rins a tal ponto que um teve que ser extraído e o outro, já em 2002, só funcionava com 30% da sua capacidade, tendo ele que submeter-se à hemodiálise.

Quando foi admitido na empresa, o trabalhador fez exame de dosagem de chumbo no sangue que evidenciou valor normal – de 24,8 mcg/dl. Ao ser demitido, foi realizado exame demissional, mas não a medição de dosagem do chumbo. Por meio de laudo pericial, o TRT verificou que a exposição aguda ao chumbo provoca lesões irreversíveis em ossos e rins, podendo progredir com gravidade extrema se o paciente não for submetido a tratamento.

Ao condenar a empresa ao pagamento de R$ 60 mil por danos morais, o TRT/MG julgou que ela se mostrou negligente ao não fazer o exame de chumbo quando demitiu o empregado, e que essa atitude é gravíssima, exigindo a reparação à autora. Por fim, salientou que os R$ 60 mil eram um valor razoável para "desestimular a ré a proceder com descaso para com seus empregados, que colocam em risco suas vidas para proporcionar à empresa o alcance de seus objetivos".

TST

Ao examinar o recurso de revista, a Sexta Turma do TST deu provimento ao apelo da empresa apenas para excluir da condenação a faculdade conferida à autora de levantar a importância definida pelo TRT. Quanto ao valor da indenização por danos morais, a decisão foi mantida inalterada.
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