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Segunda-feira, 06 de maio de 2024

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OPERAÇÃO CÉLULA MÃE

Ex-assessor diz que verbas eram sacadas por funcionários e entregues para “trabalhos sociais fantásticos” de Riva

19 Fev 2016 - 18:37

Da Reportagem Local - Paulo Victor Fanaia Teixeira

Foto: Rogério Florentino Pereira/Olhar Direto

Nelson Abdala cumprimentando José Riva na saída

Nelson Abdala cumprimentando José Riva na saída

A juíza Selma Arruda, da Sétima Vara Criminal, retomou às 14h desta sexta-feira (19) as oitivas com as testemunhas arroladas no processo que envolve o ex-deputado José Geraldo Riva pela “Operação Célula Mãe”. Ao todo, sete testemunhas foram ouvidas. Um ex-assessor de gabinete de Riva chegou a admitir que verbas eram sacadas por funcionários e entregues ao ex-deputado para realização de “trabalhos sociais”. Riva é acusado de ser o principal articulador de um conchavo que teria lesado os cofres públicos em cerca de R$ 2,6 milhões, em sua gestão entre 2010 e 2014, na Assembleia Legislativa.

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Lelis Fonseca, proprietário do restaurante Lelis Peixaria, foi a primeira testemunha a ser ouvida, às 14h10. Ela afirmou que já prestou serviço à Assembleia e que emitiu notas à AL duas por vezes. Ao MPE, revela que o pagamento, que era feito sempre em dinheiro, era realizado dias após o consumo, no setor financeiro da “Casa de Leis”. Ele nega ter recebido pagamentos em cheques.

Maristania Matos foi a segunda a falar. Ela afirma que trabalhou junto com Maria Helena Caramelo na Prefeitura de Cuiabá. Juntas, faziam serviços de atendimentos as demandas de infraestrutura da cidade. Nega que tenham sido feitas, à época, queixas à conduta de Caramelo. Ao MPE, a testemunha diz que a ré “sempre trabalhou no gabinete do deputado Riva”.

A terceira testemunha a ser ouvida foi Ariani Malouf, proprietária do restaurante Mahalo. Que diz conhecer José Riva e que realizou esporádicos jantares às autoridades da AL. Da mesma forma afirma que o pagamento era “normalmente” feito em dinheiro e que cupom fiscal era emitido, ao final do evento. Ao MPE, responde que não tem qualquer conhecimento sobre o esquema com uso de verbas de suprimento, sendo, em seguida, liberada.

Paulo Mendonça, dono da Funerária Santa Rita foi o próximo a ser ouvido. Ele afirma que prestou serviços de homenagens póstumas a AL. Geralmente, eram “responsáveis” por essa questão quem entrava em contato com a gerência da empresa para contratação, via celular. Diz que firmou “parceria” com o gabinete de José Riva. Em média, cinco serviços fúnebres eram mensalmente contratados a agencia. Os pagamentos eram feitos ao fim do mês e com apresentação de nota fiscal. Quando o serviço era prestado à AL, como um todo, a fatura ia para o CNPJ do orgão. Ao MPE, afirma que já chegou a fazer até sete serviços fúnebres por mês, ao gabinete de Riva. Quando o serviço era para a pessoa física de Riva, os pagamentos saiam da própria conta do ex-deputado.

A coordenadora de cerimoniais da Assembleia, Mara Silvia Costa, foi a quinta testemunha a falar. Ela tinha a função de organizar eventos, audiências, sessões especiais e expedia convites. Ela nega conhecer Geraldo Lauro. À defesa de Riva, nega que houvesse, a AL, para evento de semana da mulher, contratado massagistas (a pergunta se dá ao fato de as investigações apontarem que partes das verbas serviriam para contrato das mesmas). Concorda, no entanto, que para alguns eventos, havia despesas para produção de brindes e lembranças. Afirma que não saber nada a respeito de despesas e procedimentos de pagamento, sendo logo dispensada.

Tércio Lacerda de Almeida, que hoje atua na Secretaria de Estado de Infraestrutura, afirma que conheceu Maria Helena Caramelo e José Riva. Com este, apenas tratou de questões profissionais. Com aquela, tratou de questões pessoais. A testemunha foi a única a afirmar à juíza que tinha interesse pessoal no desfecho do processo (respondendo a uma pergunta padrão feita pela magistrada e que quase sempre recebe respostas negativas), afirmou que torce pela absolvição de Caramelo. Ele afirma que ela “conseguida arranjar” camisetas para eventos da igreja em que ambos convivem, como camisetas para caminhadas religiosas. Posteriormente, rasgou elogios ao caráter dá ré, que por alguns minutos, desabou em lágrimas. “A Maria Helena era um canal de acesso ao deputado Riva”, afirmou a testemunha. Eram comuns estas solicitações para deputados “ajudarem” eventos dessa natureza. Como por exemplo, cita a testemunha, serviços de locomoção para doentes e sua família. “A AL preenchia a ausência do Estado”, critica. Sobre os “auxílios financeiros”, aprofunda explicando que eles eram prestados, por exemplo, para suporte financeiro à realização de formaturas e confraternizações. “A Assembleia ia lá e pagava”. O ex-deputado Riva recebia relatório de gastos da paróquia, cita. Mas a testemunha não sabe de onde vinha o dinheiro.

Nelson Abdala foi o sétimo a falar. Ele foi assessor do gabinete de Riva, que revela ter sido o mais movimentado na AL. Ele revela que os chefes de gabinete de Riva eram cientes dos gastos que realizavam. “Na ausência do governo quem resolvia os problemas do povo era Riva”, revela. E admite que pedidos fossem feitos aos montes para o ex-deputado, desde Xerox a passagens e remédios, “tudo caia lá”, afirma. Com o tempo, Riva, segundo a testemunha, se tornou referencia de assistencialismo na AL: “Vai lá que Riva resolve”, diziam outros deputados, aos carentes que lhes procuravam, revela a testemunha. Cita exemplo: “Cai um pedaço de pau na cabeça de alguém, precisava de cirurgia, não tinha dinheiro, Riva resolvia”, diz. “Era um trabalho social fantástico”, avalia com orgulho. Ele nega qualquer desconfiança em relação ao réu Geraldo Lauro, a quem conhece há 40 anos. Admite que, ao contrário do que afirma Riva, faltavam muitos materiais na AL. Ao MP, explica que “verbas de suprimentos” (verba que é objeto da Operação Célula Mãe e Metástase) serviram para despesas não contabilizadas, para realização de trabalhos em “questões sociais”. Esse recurso era usado para “receber os problemas de gabinete”, questionado novamente se assistencialismo era feito com verbas de suprimento, ele confirma. “Devem ser por esse recurso, se não de onde iam tirar recurso?”, conclui. Por fim, admite que funcionários do gabinete de Riva sacavam recursos para entregar ao chefe, comentário que chamou maior atenção ao MPE (que em entrevista comenta o assunto).

Alaerson Soares Martins é a ultima testemunha. Trabalhou muitos anos no gabinete de José Riva. Ele era assessor parlamentar. Ele fazia atendimentos às demandas políticas (e não econômicas e “sociais”) que chegavam. Ele nega que Geraldo Lauro tivesse cometido algum ato ilícito. “Não há nada que me contrarie” (nele). Maria Helena era sempre cordial, também avalia. Por fim explica que nunca ouviu falar em verbas de suprimento e por isso é logo dispensado. A audiência foi concluída às 16h50.

Entrevista com José Geraldo Riva: 

Sobre as testemunhas de hoje, Riva avalia-as como positivas. “Fica mais do que claro que o dinheiro foi utilizado para fins públicos. Não tem nenhum recurso melhor utilizado que esse. No meu gabinete passaram mais de 250 mil pessoas que foram atendidas, de uma forma ou de outra. Essa história de jantar chique nunca houve, houve jantar para o Parlamento Amazônico, jantar para deputados. A presidência é o órgão representativo da casa, ela tem essa obrigação. Brindes para pessoas de fora, Consul, Embaixador, Deputado, Senador, é uma coisa absolutamente normal. Então tenho certeza que ao final da instrução vai ficar provado que não houve desvio”, afirma. 

Sobre os outros dois réus, Maria Helena Caramelo e Geraldo Lauro, Riva avalia. “Duas pessoas que atenderam as entidades. As pessoas que foram atendidas por eles sabem como eles conduziram. Eu tenho absoluta certeza que eles nunca pegaram um centavo desse dinheiro, assim como eu não peguei. Então tenho certeza que eles vão receber um julgamento justo, se não deste, pelo menos de Deus, e nesse eu confio”.

Sobre sua defesa, ele avalia. “Eu tenho absoluta convicção de que nesse processo, numa discussão técnica, de colegiado, eu tenho toda condição de sair inocentado”. Por fim, comenta sobre sua saúde. “Boa, graças a Deus. Tenho labirintite... problemas de rim... problemas típico de velho! Você vai envelhecendo e é natural. Tenho hipertensão, mas isso não tem me atrapalhado”.

Entenda as operações Célula Mãe e Metástase:

De acordo com o coordenador do Gaeco, o promotor Marco Aurélio Castro, “célula mãe é onde surge o câncer, o núcleo”. Entretanto, durante as investigações, perceberam que se tratava de “uma forma de corrupção endêmica”, que possivelmente não ocorria somente no gabinete do famigerado Riva. Portanto, batizaram “metástase” que, no linguajar médico, denomina “a forma como o câncer se espalha dentro do corpo” a partir da “célula mãe”.

Além do ex-deputado, na ocasião, 21 pessoas foram detidas para prestar esclarecimentos. Destes, cinco trabalhavam no gabinete de sua filha, Janaina.

De acordo com a denúncia, Riva, o suposto mentor dos outros dois esquemas citados anteriormente, também figura como principal articulador do conchavo que teria lesado os cofres públicos em cerca de R$2,6 milhões, entre 2010 e 2014, desviando as extintas “verbas de suprimento de fundos”, destinadas, na época, para pequenos gastos mensais de cada gabinete, com valores entre R$ 4 mil e R$ 8 mil.

Conforme a denúncia, o ex-parlamentar usava o dinheiro enviado ao seu gabinete para o pagamento de despesas pessoais, como o combustível de sua aeronave e honorários advocatícios, além de servir também para corromper políticos e lideranças do interior com um “mensalinho”.

A fraude ocorreu por meio de aquisições fictícias - de produtos como marmitas e materiais gráficos - feitas com a antiga verba. As notas fiscais utilizadas para justificar as compras eram falsificadas.

Segundo o testemunho de alguns servidores, eles eram coagidos a realizar pequenos saques e, posteriormente, repassavam os valores, em espécime, aos líderes do esquema (Geraldo Lauro e Maria Helena Caramello), que eram chefes de gabinete de Riva, então presidente da ALMT.

Na fase de depoimentos, Caramello teria novamente coagido testemunhas com o propósito de blindar Riva. Além disso, segundo os autos, o advogado Alexandre Nery teria prestado assessoria jurídica aos servidores na tentativa de ‘moldar’ um discurso que dificultasse a descoberta da verdade.

São réus nesta ação: José Geraldo Riva, Maria Helena Ribeiro Ayres Caramelo, Geraldo Lauro, Hilton Carlos da Costa Campos e Marisol Castro Sofré.
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