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Quarta-feira, 01 de maio de 2024

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“Não podemos permitir PJe totalmente inacessível”, diz advogada cega

“Não podemos permitir um peticionamento eletrônico totalmente inacessível”, afirma a advogada cega Deborah Maria Prates Barbosa. Militante da causa das pessoas com deficiência, a profissional do Rio de Janeiro foi homenageada pelo Conselho Federal da OAB por sua luta por um Judiciário para todos, principalmente em sua batalha pela adequação do Processo Judicial Eletrônico, que não segue convenções internacionais de acessibilidade na internet.

Falando aos conselheiros federais da Ordem, na sessão do Pleno de segunda-feira (10), Deborah contou como conseguiu superar os percalços em seu caminho e conseguir o que considera justo: o direito a peticionar fisicamente enquanto o sistema do PJe não estiver acessível a pessoas com deficiência visual. “Eu tenho obstáculos, e o dever do Estado é retirá-los para que possa exercer minha profissão de maneira igual a todos”, afirmou.

Quando o PJe foi ao ar, Deborah percebeu que não era acessível aos deficientes visuais. Munida da resolução 27 do Conselho Nacional da Justiça, de dezembro de 2009, que recomenda aos tribunais que eliminem quaisquer “barreiras físicas, arquitetônicas, de comunicação e atitudinais de modo a promover o amplo e irrestrito acesso de pessoas com deficiência às suas dependências, aos serviços que prestam e às respectivas carreiras”, solicitou que o mesmo fosse feito com o PJe.

“Qual foi minha surpresa quando o pedido foi negado”, lembra Deborah. Segundo a advogada, a decisão do presidente do CNJ, ministro Joaquim Barbosa, afirmava não haver prejuízo irreparável que justificasse a alteração. Deborah deveria continuar pedindo ajuda aos colegas para fazer o peticionamento eletrônico. “O que é algo grave que justifique uma medida antecipatória?”, questiona. “Sou posta para fora da minha profissão, perco meus alimentos, ainda sou humilhada, passo pelo vexame de ter que pedir aos meus colegas que parem seus serviços para me ajuda. Isso é vil, é desumano.”

Mesmo se sentindo “invisível”, como Deborah define as pessoas com deficiência na sociedade brasileira, a advogada procurou o Supremo Tribunal Federal para resolver a questão. Além da resolução do CNJ, levou ao ministro Ricardo Lewandowski, “um juiz de direito e de justiça”, a “Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência”, que tem valor de Emenda Constitucional. “Disse ao ministro que nossa Constituição estava sendo rasgada”, lembra. O ministro garantiu o direito de Deborah continuar peticionando fisicamente enquanto o sistema do PJe não for acessível.

Deborah ainda lembra de uma reportagem que leu em que um servidor do CNJ afirmava que “o PJe é um avião que já decolou e agora não tem mais volta”. “Nossa união fará a força e a diferença para que esse avião que decolou defeituoso retorne ao aeroporto”, diz a advogada. “O avião decolou e ele tem defeitos sérios. Se nós não o segurarmos, não o obrigarmos a essa volta temporária, até que esteja adequado, todos vamos explodir no ar. E não podemos permitir que isso aconteça”, completa a advogada.

Ao entregar a placa de homenagem (adaptada ao sistema braile) à advogada Deborah Prates, o presidente do Conselho Federal da OAB, Marcus Vinicius Furtado Coêlho, elogiou a altivez da profissional. “Nossa colega Deborah, uma heroína do direito, coloca-se, assim, reiteradamente em defesa de uma acessibilidade atitudinal, cujo objetivo não se esgota na eliminação de barreiras físicas, mas preocupa-se, sobretudo, com a eliminação das barreiras existentes nas relações entre as pessoas – diante do preconceitos que ainda estão presentes na sociedade brasileira. A questão não é a pessoa com deficiência, mas uma sociedade que lhe impõe barreiras intransponíveis”, afirmou Marcus Vinicius.

O presidente da OAB Nacional também criticou a implantação apressada do Processo Judicial Eletrônico. “Não somos contra os avanços promovidos pelo processo eletrônico, mas está comprovado que o sistema vem sendo instalado de maneira açodada, sem considerar as necessárias condições técnicas e os aspectos humanos envolvidos na transição. Não se pode avançar sobre a segurança jurídica, tornando um sistema com inúmeras falhas, como única opção de se buscar o acesso à justiça”, destacou Marcus Vinicius.
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