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Quinta-feira, 02 de maio de 2024

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Prisão em flagrante delito, incoerências

É o tipo de prisão comum do povo, ou seja, qualquer um pode prender quem está naquele momento cometendo uma infração criminal, disciplina artigo 301 do Código de Processo Penal. Já os tipos de flagrante consta no artigo 302 do mesmo código, sendo dois próprios incisos I e II, o impróprio inciso III e o presumido inciso IV, doutrinariamente existem outros tipos de flagrantes como o esperado, prorrogado, preparado ou forjado “ilegais” etc.

Ao analisarmos este tipo de prisão denota-se, ao meu ver um - flagrante desrespeito - à Constituição Federal no que tange ao direito de liberdade em alguns casos graves, vejamos:
- No artigo 5º, inciso LIV, diz: ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;

- No mesmo artigo, LVII, diz: ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;

- Também no inciso LXVI, ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança;

- Porém no inciso LXI, diz: ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei;

Ao confrontarmos os incisos acima, há uma incoerência entre os LIV, LVII, LXVI em relação ao LXI, este afronta também outros artigos como o 1º, III, princípio da dignidade da pessoa humana. Observe que há a necessidade de processo legal para que haja a prisão, ou seja, não de inquérito policial. Ocorre que o artigo 5º é considerado uma clausula pétrea, ou seja não pode ser alterada, salvo em caso de uma nova Constituição “poder originário”.

A prisão em flagrante delito, por ser um tipo de prisão, onde qualquer um exercer, porém prática se resume na autoridade policial “Delegado” o ato da prisão em flagrante delito, pois a policia militar ou qualquer um do povo apenas conduz ou aguarda a polícia para que o conduza até a delegacia.

Como o delegado não pode e nem deve julgar o que é certo ou errado, pois não possui o poder jurisdicional, esta é apenas de competência do judiciário, há em alguns casos graves “abusos”, como ocorrem na prática.

Supondo os seguintes fatos:
- Um individuo adentra armado de madrugada em sua residência, você também armado “arma legalizada” dispara um único tiro que vem a matar o indivíduo, logo você entra em contato com a polícia e aguarda a autoridade. Ocorre que no olhar do artigo 302 do Código Processo Penal, você acaba de cometer um crime intitulado no artigo 121 do Código Penal, logo você vai ser preso em flagrante delito.

- Uma adolescente de 13 anos sai de sua casa para estudar, no caminho desvia e vai para a casa do namorado a mesma já não era mais virgem, tendo por diversas vezes praticado atos sexuais o seu namorado “primo” também de 13 anos. Os pais desconfiados da filha a pressiona e a mesma para proteger o parente, afirma após chegar em casa que foi o professor quem a forçou a cometer o ato, todos se dirigem à delegacia e a menor confirma o fato “mentiroso” para o delegado de polícia, o corpo e delito confirma o ato sexual, de imediato a polícia em diligência prende o professor em flagrante delito pelo crime de estupro de vulnerável, artigo 217-A Código Penal.

Veja que nos exemplos acima, no primeiro caso houve legitima defesa “artigo 23, inciso II do Código Penal” e no segundo uma denuncia caluniosa “artigo 339, do mesmo código”, porém em ambos os casos não cabe ao delegado decidir se foi ou não legítima defesa, não cabe também ao delegado dizer se houve a denuncia caluniosa, na prática ocorrerá a prisão em flagrante delito. Não aqui questionado se a prisão é ilegal ou não, não tenho dúvida que seja ilegal.

Ocorre que inocentes pelo Brasil estão sendo encarcerados sem justa causa, veja que também na prática esses inocentes ficam junto com outros presos, isso quando não são enviados para presídios por falta de vagas em delegacias. Durante esse lapso entre a prisão e o relaxamento da prisão, o inocente passou danos irreparáveis, pois teve a sua honra, imagem, moral, liberdade totalmente restringida pela grave falha legislativa do instituto da prisão em flagrante, e que precisa ser urgentemente revista. No segundo caso, se isso correr com um pai de família casado, como ficará o relacionamento do casal? O que pensará seus filhos, vizinhos, amigos, patrão? Pior ainda, e quando esse indivíduo é hostilizado e humilhado nos jornais e programas televisivo, principalmente os sensacionalistas? Definitivamente um absurdo legalizado.

Caso o prejudicado intente com ação por dano moral na esfera civil contra o Estado, pode ter a surpresa de não ser indenizado, pois existem milhares de decisão não deferindo tal pedido, sob a alegação de que não cabe a policia militar, nem muitos a autoridade policia civil afirmar que tal prisão é ou não ilegal, e que o poder policial é coercitivo, assim agiu corretamente. Agora, caso consiga demonstrar tal ilegalidade e seja aceita o pedido da indenização, o magistrado ao fixar o quantum invocarão o princípio do enriquecimento sem causa em conhecido como "nemo potest lucupletari, jactura aliena", ninguém pode enriquecer sem causa, logo fixam na sentença valores irrisórios, incompatíveis com os danos sofridos.

Diante disso acredita o judiciário ”juiz-estado” que R$ 5 mil, R$ 10 ou valor semelhante vai reparar tal dano, isso depois de uma longa batalha judicial que durará anos e anos, o que é outro absurdo.

Assim, tal instituto da prisão em flagrante deve ser revisto, pois ao delegado de polícia cabe somente aplicar a fiel letra da lei, porém princípios constitucionais estão sendo desrespeitados pela própria lei, no caso o Código de Processo Penal. Caso não o seja, milhares de pessoas ano a ano continuarão a serem humilhadas por ficção jurídica “legalmente” instituídas pelo poder público, não pela ilegalidade da prisão, mas sim pela humilhação sofrida por um cidadão de bem ao ser preso injustamente, enfrentar um processo judicial criminal, depois receber um dano moral que não paga nem o advogado que o defendeu criminalmente, o judiciário tem demandando trocados em troca humilhações impagável. O que é um absurdo instituído!


Elvis Crey Arruda de Oliveira – Estudante de direito 10 Semestre UNIC e servidor público estadual.
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