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Quinta-feira, 02 de maio de 2024

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A advocacia não vai se calar

Os advogados brasileiros lamentam enormemente a presença de um Joaquim Barbosa no Poder Judiciário e ficam perplexos a cada declaração infeliz do atual Presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça. Oriundo do Ministério Público, Barbosa desconfia que todos os demais personagens do mundo jurídico são desonestos – juízes e advogados.

Nunca se identificou com o próprio poder republicano que integra, plantando dúvidas sobre a honestidade de colegas ministros, de magistrados e de advogados. A mais recente errata: para combater a corrupção, Barbosa afirmou que é preciso acabar com a representação de advogados nos tribunais eleitorais.

Os tribunais regionais eleitorais são formados por magistrados de carreira de primeira e segunda instâncias, estaduais e federais,advogados e, como fiscais, promotores federais. Como todos os demais tribunais, essa composição eclética enriquece o debate judiciário, porque concentra diversos pontos de vista jurídicos, além de vivências ecléticas num mesmo julgamento.

O tribunal do júri, por exemplo, soberano constitucionalmente é formado por sete jurados leigos, escolhidos entre os cidadãos do povo e, nem por isso, sofre qualquer ataque tresloucado de Joaquim Barbosa. Especificamente os advogados estão sob o fogo da recalcada figura salvacionista do neo-Robespierre que, de tão inflexível, foi guilhotinado para que o mundo seguisse em paz.

O que deve mudar não é a simples exclusão de advogados dos quadros judiciários, porque os promotores também estariam alijados de compor os tribunais, pela constitucional isonomia. No caso específico dos tribunais regionais eleitorais, os advogados deveriam perceber as mesmas verbas que os julgadores de segunda instância, de modo a que pudessem diminuir ou acabarcom a própria advocacia, a fim de haver dedicação exclusiva aos processos eleitorais.

O que é ridículo é um advogado ganhando 5 mil reais para decidir o destino eleitoral em certames nos quais circulam milhões, deixando de atuarem na próspera seara eleitoral, dando uma contribuição ao Poder Judiciário por tão pouco. É embaraçoso e indigno o tratamento desigual que os advogados recebem.

Considerando-se sempre superior, Barbosa denuncia conluios entre juízes e advogados, mas lhe falta coragem de nominar quem é quem. Flerta com a opinião pública e se utiliza do fermento popular em pleno período de insatisfação social para canalizar a própria frustração contra a advocacia brasileira.

Na distorcida visão de um acusador togado, Barbosa omite-se em qualquer crítica ao Ministério Público como, por exemplo, o estapafúrdio parecer do Procurador Geral pela intervenção judiciária no Congresso Nacional ou a perda de prazo ministerial em grandes processos como de Daniel Dantas ou ainda as centenas, milhares de anulações de operações ilegais conduzidas por promotores de justiça. Seletivo em seu ódio, preferebabar rancor contra a advocacia, apontando na classe o foco da corrupção nos tribunais brasileiros.

O Presidente do Supremo Tribunal Federal é um desfavor ao Poder Judiciário. Seus discursos só provam que equilíbrio psicológico em nada se relaciona com cultura, erudição ou preparo jurídico. É possível haver notórios recalques oriundos de ocultas frustrações até mesmo nos mais altos cumes republicanos.

Afastar a advocacia da composição judiciária é dar mais um passo para a falta de diálogo, de oxigenação, golpeando a dinâmica dos tribunais e condenando-os a complexos narcisistas. Estudiosos de psicologia deveriam aproveitar o quadro de um dos mais altos dignatários republicanos para compreender o impacto deletério do poder excessivo em mentes débeis.

O Brasil, num momento de riqueza democrática, de congraçamento nas ruas, de exortação pelo fim da corrupção e de demanda por profundas reformas políticas, não precisava de um ditador travestido de populista. Um incendiário que pretende voltaraopinião pública contra a advocacia brasileira é, no mínimo, irresponsável e definitivamente não merecia a honra de compor o Poder Judiciário e nem muito menos dirigi-lo.

Aliás, quem não merecia esse escárnio é a comunidade jurídica e a sociedade brasileira que encontraram nos advogados, artistas e jornalistas trincheiras contra a ditadura militar. Ninguém se engane com Barbosa: é, na verdade, um emplumado aristocrata grego que acredita que os “sábios” devem nos governar, escolhidos pelos “honestos”, sufragados pelos “virtuosos”, indicados por ele.

Eduardo Mahon é advogado.

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