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Quinta-feira, 28 de março de 2024

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Empresa indenizará ex-empregado por não dar baixa em crachá

A 7ª turma do TRT da 3ª região condenou uma empresa a indenizar em R$ 4.710,00, a título de danos morais e matérias, um ex-funcionário por não dar baixa em seu crachá de identificação após sua dispensa. O trabalhador foi contratado por outra companhia, mas não pôde continuar no emprego, porque a nova empregadora ficou impossibilitada de providenciar novo crachá.

De acordo com a juíza relatora Maristela Íris da Silva Malheiros, "é imprescindível que a ex-empregadora dê baixa no crachá do empregado dispensado, para que este possa continuar realizando suas funções nas dependências da empresa tomadora, através de outra prestadora de serviços".

A magistrada também pontuou que "se a conduta do agente ofensor lesa os direitos da parte, privando-a da oportunidade de obter os benefícios de uma dada situação, essa perda da chance autoriza o deferimento de uma compensação, proporcional ao valor da chance perdida".


Processo: 0001060-27.2011.5.03.0062

Veja a íntegra da decisão.


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PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO – 3ª REGIÃO

TRT-RO-01060-2011-062-03-00-0

Recorrente: CADAR ENGENHARIA CONSTRUCOES LTDA.

Recorrido: D.J.L.

EMENTA: INDENIZAÇÃO POR PERDA DE UMA CHANCE – DANOS MORAIS E MATERIAIS. A teoria da responsabilidade civil pela perda de uma chance autoriza o deferimento de indenização por danos morais e materiais quando a probabilidade de obtenção de um resultado positivo que é esperado pelo lesionado é obstado por ato ilícito praticado pelo agente ofensor. Se o reclamante, ex-empregado da reclamada, tinha como real a chance de manter-se no mercado de trabalho (já que fora admitido por outra empresa que presta serviços para a mesma tomadora), mas a viu perdida em razão do ato ilícito praticado pela reclamada, que não deu baixa no crachá que permitia o acesso às dependências da tomadora, impossibilitando a liberação de novo crachá, mister se faz o deferimento da reparação patrimonial e moral daí decorrente. Com efeito, se a conduta do agente ofensor lesa os direitos da parte, privando-a da oportunidade de obter os benefícios de uma dada situação, essa perda da chance autoriza o deferimento de uma compensação, proporcional ao valor da chance perdida.

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Recurso Ordinário, em que figuram, como recorrente, CADAR ENGENHARIA CONSTRUCOES LTDA. e, como recorrido, D.J.L..

RELATÓRIO

A Exmª Juíza da Vara do Trabalho de Itaúna, por intermédio das sentenças de f. 42/44v e 55/55v, julgou procedentes em parte os pedidos formulados na reclamação trabalhista ajuizada por D.J.L. em face de CADAR ENGENHARIA CONSTRUCOES LTDA.

A reclamada recorre dessa decisão (f. 66/78). Opõe-se ao deferimento da indenização por danos morais e materiais, pedindo a redução dos valores fixados a esses títulos.

Quitadas as custas processuais, foi também efetuado o depósito recursal, conforme documentos de f. 89/80.

O reclamante apresentou contrarrazões (f. 83/85).

Dispensado o parecer escrito da douta Procuradoria Regional do Trabalho, porque ausente interesse público no deslinde da controvérsia.

É o relatório.

VOTO

O recurso interposto pela reclamada é próprio, tempestivo, a representação está regular (f. 40), e foi realizado o preparo (f. 79/80).

Conheço do apelo, porque atendidos os pressupostos de sua admissibilidade.

MÉRITO

O reclamante trabalhou como servente de obras para a reclamada (CADAR ENGENHARIA CONSTRUCOES LTDA.), no período de 12.01.11 a 26.01.11 (f. 08). Na inicial, ele postulou o pagamento de indenização por danos morais e materiais, aduzindo, em síntese, que a demandada presta serviços para a USIMINAS e essa empresa exige que as prestadoras deem baixa no crachá de identificação de seus empregados, por ocasião de suas dispensas, sob pena de estes não poderem trabalhar em suas dependências através de outras empresas. Salientou o obreiro que, após ser dispensado pela ré, foi contratado pela Construtora Mello de Azevedo S.A., que também presta serviços na USIMINAS, mas foi impossibilitado de prosseguir a prestação laboral, uma vez que a reclamada não providenciou a baixa de seu crachá, obstando a liberação de outro crachá, pela nova empregadora e, consequentemente, seu ingresso nas dependências da empresa tomadora, o que ocasionou a sua dispensa. Argumentou, assim, que por negligência da reclamada passou por grandes constrangimentos, pois foi retirado do ônibus da nova empregadora e teve que aguardar em casa a solução da demandada, referente à baixa no crachá, o que não ocorreu, vindo a perder o seu emprego.

Em sede de contestação, a reclamada aduziu que a pretensão inicial não encontra amparo em qualquer norma positivada no direito pátrio; acrescentou que o obreiro não provou suas alegações, tampouco narrou os danos suportados, o que autorizaria o indeferimento da peça vestibular, por inépcia. Afirmou, outrossim, que “em nenhum momento se pode vislumbrar a ocorrência de conduta ilícita da reclamada em face dos fatos alegados pelo obreiro”, asseverando que “não tem qualquer gerenciamento sobre a administração da USIMINAS, não cabendo à CADAR ENGENHARIA CONSTRUÇÕES LTDA. dar baixa nos registros de um funcionário perante aquela empresa” (f. 19 – os grifos constam do original). Assegurou, por fim, que não há prova de sua culpa pela dispensa junto à Construtora Mello Azevedo, da existência de danos materiais ou morais, e do nexo de causalidade.

O d. Juízo de primeiro grau acolheu parcialmente o pleito, condenando a reclamada a pagar ao autor R$3.500,00, a título de danos morais, e R$1.210,00, pelos danos materiais.

A empresa demandada se insurge contra a condenação imposta, pugnando ainda pela redução dos valores atribuídos às indenizações deferidas.

Examino.

Ressalto, de início, que a situação dos autos reflete a insatisfação do autor com a perda do novo emprego obtido, assegurando o obreiro que isso se deu por culpa da reclamada e, por isso mesmo, ela deverá arcar com a reparação correspondente.

Com efeito, a teoria da responsabilidade civil pela perda de uma chance torna indenizável a probabilidade de obtenção de um resultado positivo que é esperado pelo lesionado, no caso o empregado, que é obstado por ato ilícito praticado pelo agente ofensor, o empregador.

No caso em exame, a análise da peça de defesa revela que a reclamada não negou a ausência da “baixa” no crachá do reclamante, limitando-se a sustentar que não está obrigada a fazê-lo, o que afasta a prática de conduta ilícita.

O documento de f. 11, todavia, conduz a entendimento contrário. Trata-se de declaração feita pelo encarregado do Departamento de Pessoal da Construtora Mello de Azevedo S.A., cujo conteúdo não foi impugnado pela ré.

Confira o seu teor:

“Declaramos que o Sr. D.J.L., CTPS nº ... série ..., contratado por nossa empresa em 26.07.11, na função de servente, está impossibilitado de realizar suas funções para a qual foi contratado pelo fato da Empresa Cadar Engenharia que também atua na área da MUSA, e em qual o mesmo prestou serviços ainda não deu baixa em seu crachá, ele foi desligado da empresa em 26 de janeiro de 2011 e até a presente data não foi feito o desvinculo junto a fiscalização (LOGOS) impossibilitando a nossa empresa de liberar o crachá de nosso colaborador e com isso nos causando transtorno e prejuízo. Informamos que a nossa gerência nos deu o prazo até 12.09.11 (segunda-feira) às 12:00 horas para regularizarmos essa pendência, caso o contrário teremos que fazer a demissão do mesmo” (grifamos).

Como se vê, é imprescindível que a ex-empregadora dê baixa no crachá do empregado dispensado, para que este possa continuar realizando suas funções nas dependências da empresa tomadora, através de outra prestadora de serviços.

Em razão disso, está correto o d. Juízo de origem ao reconhecer que a baixa no crachá, pela reclamada, constitui “obrigação acessória ao contrato de emprego” (f. 43).

Por outro lado, como o reclamante veio a ser dispensado pela nova empregadora no dia 15.09.11 (f. 10), é forçoso reconhecer que até a data limite fixada pela gerência dessa empresa (12.09.11) a reclamada ainda não havia cumprido sua obrigação, junto à fiscalização da Usiminas, de forma a possibilitar a liberação de novo crachá e o acesso do reclamante à tomadora.

Quanto à declaração de f. 30 (através da qual a “LOGOS” declarou inexistir pendência relativa ao reclamante ou restrições à sua contratação por outras empresas no Projeto Mineração Usiminas), ressalto que ela foi emitida em 27.09.11, ou seja, quando o autor já havia, inclusive, sido dispensado pela nova empregadora. Logo, referido documento não faz prova em favor da reclamada.

Pois bem.

Não há dúvida de que é reprovável a conduta negligente da demandada, que sequer fez prova de qualquer fato impeditivo do cumprimento da obrigação de proceder à baixa no crachá do reclamante, em prazo plausível, após a sua dispensa. Por outro lado, são manifestos os prejuízos materiais sofridos pelo autor, decorrentes da impossibilidade de prosseguir a prestação laboral e de manter o sustento próprio e de seus familiares. Inegável, também, o sentimento de tristeza do reclamante, advindo da perda da oportunidade de emprego e do fato de se ver à margem do mercado de trabalho. Saliento, a propósito, que o dano moral na hipótese é presumido, sendo desnecessário que o autor decline ou comprove a sua dor. Não há que se falar, por essa razão, em inépcia da inicial.

Dessa forma, se o reclamante tinha como real a chance de manter-se no mercado de trabalho, mas a viu perdida em razão do ato ilícito praticado pela reclamada, mister se faz o deferimento da reparação patrimonial daí decorrente. Com efeito, se a conduta do agente ofensor lesa os direitos da parte, privando-a da oportunidade de obter os benefícios de uma dada situação, ou de evitar os malefícios de uma outra, essa perda da chance autoriza o deferimento de uma compensação, proporcional ao valor da chance perdida.

Saliente-se que o caso em exame não trata de uma possibilidade de contratação por uma outra empresa. Repita-se, a contratação por outra empresa existiu e somente não prosseguiu em face da ausência da “baixa” no crachá.

Cumpre trazer à baila os seguintes arestos:

“PERDA DE CHANCE. DANOS MORAIS. INDENIZAÇÃO. No campo da responsabilidade civil existe uma construção doutrinária segundo a qual a lesão ao patrimônio jurídico de alguém pode consistir na perda de uma oportunidade, de uma chance de se beneficiar de uma situação favorável ou de evitar um acontecimento desfavorável. Há, aí, um prejuízo específico, desvinculado do resultado final. Como se trata de uma chance, existe, ao lado do prognóstico negativo, também a previsão da ocorrência de um resultado positivo, embora a conduta do agente obste que se conheça o desfecho do caso. Não se podendo garantir o resultado favorável, tampouco se pode vaticinar a obtenção do resultado desfavorável. O dano se evidencia pela perda da chance, sendo tanto mais grave quanto maiores forem as probabilidades em relação a um certo resultado. Exemplos típicos são o do estudante que não consegue fazer uma prova; o da pessoa de carreira promissora, que vem a ser vítima de um acidente; o do cliente cujo advogado não ajuíza uma determinada ação, etc. Nesse caso, não há propriamente dano material, pois se trata de uma hipótese. Se, porém, a conduta do agente lesa os direitos da parte, privando-a da oportunidade de obter os benefícios de uma dada situação, ou de evitar os malefícios de uma outra, essa perda da chance dá lugar a uma compensação, proporcional ao valor da chance perdida”. (01518-2003-029-03-00-7 RO, Publ. 06/12/2003, 3a. Turma, Rel. Des. Sebastião Geraldo de Oliveira).

“EMENTA: RESPONSABILIDADE CIVIL – INDENIZAÇÃO PELA PERDA DE CHANCE. Recente construção doutrinária está evoluindo para uma terceira modalidade de dano, com base na responsabilidade civil prevista nos arts. 186 e 927 do Código Civil. Refere-se à indenização pela "perda de uma chance ou oportunidade", quando a vítima é privada da oportunidade de obter certa vantagem, em face de ato ilícito praticado por terceiro, configurando-se um prejuízo material indenizável, consubstanciado na real probabilidade de um resultado favorável esperado, caso não fosse obstado pela conduta ilegal do ofensor”. (01405-2008-077-03-00-0 RO, Publ. 25.05.2009, 8a. Turma, Rel. Des. Cleube de Freitas Pereira)

No que concerne ao quantum indenizatório de R$1.210,00, arbitrado aos danos materiais, ele me parece justo e não merece ser reduzido. Como ressaltado em primeira instância, o contrato firmado com a reclamada vigorou por 4 meses, o novo contrato firmado com a empregadora do autor à época do ilícito praticado pela ré já perdurava por dois meses, e o valor fixado na sentença a título de danos materiais corresponde a duas vezes o salário percebido pelo autor na Construtora Mello Azevedo.

Quanto à compensação pelos danos morais, saliento que o sofrimento interno gerado pela conduta da reclamada é de difícil mensuração, e não existe critério previsto no ordenamento jurídico para a fixação do quantum indenizatório. É necessário, todavia, que o valor fixado indenize o sofrimento impingido ao autor e compense, razoavelmente, os prejuízos ocasionados pelo infortúnio, sem, contudo, propiciar o enriquecimento sem causa do lesionado, buscando, ainda, o efeito inibitório da repetição do risco e danos.

Em se tratando de danos morais, devem os critérios de fixação da importância da indenização observar o duplo caráter de compensação para a vítima e de punição para o agente, considerando-se também a condição socioeconômica e cultural da vítima, a capacidade de pagamento do agente e seu grau de culpa e a extensão do dano em si. Sopesando todos esses critérios, entendo que o valor fixado na origem (R$3.500,00) está condizente com as condições da vítima e ofensor, extensão do dano, gravidade da culpa, além de cumprir o efeito inibitório da repetição do ilícito.

CONCLUSÃO

Pelo exposto, conheço do apelo; no mérito, nego-lhe provimento.

FUNDAMENTOS PELOS QUAIS,

O Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, por sua 7ª Turma, unanimemente, conheceu do apelo; no mérito, sem divergência, negou-lhe provimento.

Belo Horizonte, 08 de março de 2012.

Maristela Íris da Silva Malheiros

Juíza Relatora
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