O Ministério Público do Estado (MPE) recorreu da sentença que absolveu sumariamente o tenente-coronel da Polícia Militar Otoniel Gonçalves Pinto da acusação de homicídio. Otoniel é alvo de ação penal por ter matado Luanderson Patrik Vitor de Lunas, que auxiliou um comparsa durante roubo à sua casa, em 2023. A tese de legítima defesa, que culminou na absolvição, é contestada pelo promotor Vinicius Gahyva Martins, que aponta alterações no local do crime e recorte nas imagens das câmeras de segurança, que poderiam ter capturado o momento exato dos disparos.
Leia mais:
Por descumprimento do plano de RJ e inadimplência com credores, "Rei do Algodão" é alvo de novo pedido de falência
Em setembro, a juíza Helícia Vitti Lourenço absolveu Otoniel, considerando que ele teria agido sob legítima defesa. “O mesmo contexto fático-probatório demonstra a presença de circunstâncias extremes de dúvida apta a excluir a ilicitude da conduta, porquanto inequivocamente atuou em legítima defesa própria e de terceiros e no estrito cumprimento do dever legal, de maneira que a absolvição sumária é medida que se impõe”, decidiu.
É contra a sentença absolutória e a versão de Otoniel que o promotor Vinicius Gahyva Martins apresentou recurso de apelação. Martins sustenta que a legítima defesa é insustentável, pois o roubo já estava consumado e a vítima estava em fuga, não havendo mais perigo iminente.
O documento também aponta diversas inconsistências e alterações na cena do crime, como o inadequado isolamento do local e o suposto recorte de imagens de câmeras de segurança que poderiam ter capturado o momento dos disparos. Com base nas provas, o Ministério Público solicita a pronúncia de Otoniel para que ele seja julgado pelo Tribunal do Júri pela prática de homicídio.
Na peça, foi verificado que diversos policiais à paisana estiveram no local do crime e, lá, teriam alterado toda a cena, mexendo nas munições deflagradas e imagens de segurança.
Os estojos deflagrados pela arma de fogo de Otoniel, por exemplo, foram localizados no interior da garagem da residência, o que indica terem sido movidos de sua posição original, uma vez que todos os disparos efetuados ocorreram quando este já se encontrava na rua.
Em relação às câmeras, os equipamentos estavam instalados em ângulos que flagrariam toda a ação de Otoniel. Estranhamente, porém, o único trecho das captações que não consta nos autos é justamente o que ele apareceria efetuando os disparos.
“Da análise dos referidos vídeos, percebe-se que, conquanto a câmera de vigilância acima estivesse perfeitamente posicionada para captar toda a dinâmica delitiva, as filmagens apreendidas foram recortadas, de modo que os arquivos de mídia colacionados aos autos, curiosamente, não contêm o momento em que o réu realiza os disparos que vitimaram LUANDERSON”, diz trecho da apelação.
O fato ocorreu no dia 28 de novembro de 2023. De acordo com a denúncia, Otoniel, morador do bairro Santa Marta, em Cuiabá, retornou para casa após deixar seus filhos na escola e foi surpreendido por um ladrão armado em sua residência. O criminoso rendeu Otoniel, sua esposa, o sogro do oficial, roubando diversos objetos pessoais. Os idosos chegaram a ficar trancados em um quarto.
Otoniel foi forçado a abrir o portão da residência para permitir a fuga do bandido. Entretanto, após abrir o portão, Otoniel pegou sua arma funcional e saiu para tentar pegar os criminosos.
Na sequência, o ladrão entrou em um carro Chevrolet Cobalt, que era dirigido por Luanderson, momento em que Otoniel atirou oito vezes, na direção do veículo e atingiu a cabeça de Luanderson. De acordo com o laudo pericial, houve o rompimento total da medula espinhal.
Mesmo baleado, Luanderson ainda dirigiu poucos metros até a Rua João Paulo II, mas não resistiu e morreu.
O tenente-coronel afirmou que agiu para defender a família ao atirar em Luanderson Patrik Vitor de Lunas, "Durante 40 intermináveis minutos de terror, sob a mira de um revólver, entre a vida e a morte, assistimos à profanação de nosso sagrado lar sem esboçar qualquer reação, tudo para o fim de preservar nossas vidas. Contudo, mesmo obedecendo todas as ordens do criminoso, os adereços que adornam minha residência revelaram ao ladrão que ali residia uma família militar, um trabalhador da Polícia Militar", diz trecho da nota.
O policial explicou que, à época do fato, o delegado responsável entendeu que a conduta do agente foi defensiva e reativa à violência evidenciando a legítima defesa.