A desembargadora Juanit Clait Duarte, do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT), negou transferir para Rosário Oeste o júri do policial militar Ricker Maximiano, feminicida que confessou ter assassinado a própria esposa, Gabrieli Daniel de Sousa, em maio de 2025, com três tiros na casa do casal, em Cuiabá.
Leia mais
Acusados de intermediar assassinato de Nery, agentes da Rotam são mantidos presos pela Justiça
Em decisão proferida nesta quarta-feira (25), a magistrada da Segunda Câmara Criminal negou pedido de desaforamento feito pela defesa de Ricker, que buscava alterar o local e a data do julgamento sobre tentativa de homicídio que cometera em 2018, o qual está agendado para o dia 8 de julho de 2025, às 9h, da 1ª Vara Criminal de Cuiabá.
O requerimento de alteração foi feito em ação que o PM é denunciado por tentar assassinar o adolescente de 17 anos W.V.S.C. em 2017, quando não gostou que ele tivesse visto para uma discussão que travava com sua então namorada, Gabrieli.
Em 2020, a promotora de Justiça Regilaine Magali Bernardi Crepaldi, do Ministério Público, denunciou Maximiano por tentar ceifar a vida do jovem, que foi atingido a tiros no glúteo esquerdo, precisando de cirurgia de urgência que caracterizou risco de vida, não se consumando o homicídio pelo pronto socorro médico ofertado.
Segundo Crepaldi, a tentativa aconteceu no dia 23 de junho de 2018, na Avenida General Melo, capital, quando a vítima estava retornando para sua casa, por volta das 23h, na companhia de dois amigos. Conversando e dando risada uns dos outros, os adolescentes, porém, se depararam com um casal discutindo na rua, o qual se tratava de Maximiano e sua então namorada. Neste momento, o policial falou para os adolescentes: “o que vocês estão rindo, vaza. Vaza”. Na mesma hora, ele levantou a camisa e tirou uma arma de fogo da cintura.
Ao verem o policial armado, os adolescentes saíram correndo, mas foram perseguidos por ele. Após correrem por alguns metros, a vítima percebeu que o indiciado parou, pelo que também parou de correr, momento em que Maximiano, pelas costas, efetuou disparos de arma de fogo contra W.V.S.C., sendo que um deles atingiu o glúteo da vítima.
O adolescente passou por cirurgia de urgência de laparotomia, e só não morreu pelos socorros que recebera a tempo. Os ferimentos causados provocaram debilidade permanente na função urológica da vítima, a qual apresenta deficiência da sensibilidade, incapacidade de sentir a vontade de urinar espontaneamente, necessitando realizar cateterismo (passagem de sonda) para esvaziar a bexiga.
Para Crepaldi, o crime foi cometido por motivo fútil, uma vez que o policial atirou por não gostar que os adolescentes tivessem olhado para a discussão que tinha com a namorada. O recurso que dificultou a defesa da vítima, restou demonstrado por ter sido atingida pelas costas, enquanto procurava correr do indiciado. Diante disso, ele foi pronunciado para ser julgado pelo júri.
Enquanto o julgamento não ocorreu, Maximiano cometeu o feminicídio contra Gabrieli, que, por sua vez, atuaria no júri do caso de 2018 como sua testemunha de defesa. Para o desaforamento, os advogados alegam a intensa comoção social e o que chamam de "linchamento social" provocado pelo novo crime, o feminicídio ocorrido em 26 de maio de 2025, que, embora não seja o objeto do processo atual, poderia contaminar a imparcialidade dos jurados.
Segundo os advogados Rodrigo Pouso Miranda e Rodrigo Rabelo Neri, o réu se tornou alvo de repúdio social generalizado devido ao assassinato de Gabrieli, assassinada a tiros por Maximiano na casa do casal, situada no bairro Praeirinho, capital.
Advogados afirmam que há um risco evidente de o réu ser julgado por sua personalidade e por estigmas sociais e morais, e não pelos fatos dos autos do processo original, caracterizando uma "perigosa aplicação do Direito Penal do Autor", repudiada pela doutrina e jurisprudência.
A defesa destaca que a manutenção do julgamento em Cuiabá, uma comarca "claramente contaminada" por este segundo fato ainda pendente de apuração judicial, violaria o princípio da paridade de armas. Eles alegam que a acusação já possui uma "enorme vantagem processual" ao contar com o "juízo moral e emocional pré-consolidado da comunidade local", comprometendo o direito constitucional à imparcialidade do julgador e a plenitude de defesa. Diante disso, pediram que ele seja julgado na comarca de Rosário Oeste.
Examinando o pedido, contudo, a desembargadora anotou que a defesa não apresentou evidências suficientes que pudessem comprometer a imparcialidade do júri. Na ordem liminar, Juanita asseverou que o descontentamento da defesa com repercussão social dos fatos não revela motivo suficiente para o desaforamento.
“Não há evidências suficientes de comprometimento da imparcialidade do júri. a jurisprudência é pacífica no sentido de que o mero descontentamento da defesa com eventual repercussão social dos fatos, ou com a existência de notícias veiculadas na mídia, não se revela, por si só, fundamento suficiente para o deferimento do desaforamento, que, como cediço, possui natureza absolutamente excepcional e exige demonstração cabal de comprometimento efetivo da imparcialidade dos jurados — o que não se verifica no presente caso”, decidiu.
Antes de o colegiado da Câmara Criminal julgar o mérito do pedido, a magistrada determinou que o juízo de primeiro piso apresente, em cinco dias, informações acerca da alegada dúvida quanto a imparcialidade dos jurados.
Feminicídio
Em depoimento à Polícia Civil, o afirmou estar "arrependido" por ter assassinado a esposa e que "destruiu a vida de sua família". Conforme apurado pela reportagem, o policial foi ouvido por cerca de 12 minutos e, durante a oitiva, permaneceu em silêncio sobre os detalhes do crime, mas expressou profundo arrependimento.
O crime ocorreu na residência do casal, localizada na rua Paraju, no bairro Praeirinho. Após o homicídio, Maximiano fugiu do local levando os filhos do casal, de 3 e 5 anos.
Gabrieli foi encontrada sem vida por uma equipe médica acionada para o atendimento. Inicialmente, o armamento utilizado no crime não foi localizado. Posteriormente, o soldado apresentou a pistola .40 usada no homicídio à DHPP.
O delegado Edson Pick, responsável pela investigação, criticou a atuação da Polícia Militar no caso, alegando que a corporação interferiu na cena do crime ao remover a arma utilizada, o que pode prejudicar as investigações.