O juiz Márcio Aparecido Guedes bloqueou todos os bens da AFG Brasil S/A até que ela comprove que cumpriu o Plano de Recuperação Judicial, apresentado para tentar renegociar R$ 648 milhões em dívidas, sob pena de ter a falência decretada. Na decisão proferida nesta terça-feira (26), o juiz entendeu que deveria intimar a AFG antes de dar início ao processo falimentar, pretendido tanto pelo Ministério Público como por boa parte dos credores.
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O último andamento no processo antes desta decisão de Guedes foi um pedido feito pelas empresas Nova Aliança Agro, Anglopar Agro e a Família Scheffel Schwartz, as quais apresentaram mais um requerimento de falência contra a AFG.
Os credores expuseram no requerimento os atrasos e descumprimentos que caracterizaram a gestão financeira da AFG durante a tentativa de reestruturação. Requerimento foi assinado pelos advogados Felipe Sampieri Iglesias e Josmeyr Alves de Oliveira no último dia 11. Mas, antes disso, diversos outros pleitos nesse sentido foram feitos, inclusive pelo Ministério Público.
Na ordem, o juiz Aparecido Guedes se convenceu da gravidade dos elementos apontados pelo órgão ministerial e credores, no entanto, antes de decretar a falência, decidiu intimar a AFG para comprovar se cumpriu, ou não, o Plano. Em caso de descumprimento, dentro do prazo estabelecido de 5 dias, a falência será decretada.
Acusações de fraudes e descumprimentos
Os autores argumentam que a recuperação judicial da AFG Brasil se tornou um “espetáculo de promessas vazias” e uma espécie de “limbo histórico,” onde a empresa continua operando sem que se perceba avanço real na sua saúde financeira.
Desde o início, a expectativa era que a AFG Brasil utilizasse o processo para restaurar sua viabilidade econômica. No entanto, uma sequência de descumprimentos – incluindo atrasos nos pagamentos e desrespeito aos compromissos assumidos – apontam para uma incapacidade de alcançar uma recuperação efetiva.
Os credores, então, defendem que a situação da AFG Brasil S/A fere os interesses deles próprios, que aguardam uma resolução definitiva, mas enfrentam sucessivas desilusões com a ausência de uma decisão judicial sobre a conversão do processo em falência.
A situação é descrita pelos credores como um ciclo de prolongamento desnecessário, que resulta apenas em perda de tempo e recursos, o que agrava a situação financeira de todos os envolvidos.
Diante da urgência do caso, os requerentes ainda criticaram a morosidade da 1ª Vara Cível de Cuiabá em julgar os pedidos de falência.
A mudança constante de juízes – chamada de “dança dos juízes” pelos peticionários – compromete a celeridade do processo, segundo a crítica feita ao “Juízo” (ou ao sistema judiciário como um todo, em vez de um juiz específico).
A crítica também inclui o destaque para as recomendações ignoradas tanto do Ministério Público quanto do Administrador Judicial, ambos favoráveis à falência, reforçando a ideia de que a falta de uma decisão resulta de um Judiciário que perpetua a indefinição ao invés de priorizar uma resolução clara.
O pedido de conversão relembra os indícios de fraudes, descumprimento do plano de recuperação, atraso no pagamento de funcionários, inatividade da empresa e inadimplência para com credores extraconcursais.
Também mencionam uma reportagem recente, que abordou a “indústria da recuperação judicial” no Brasil. Segundo essa análise, o processo de recuperação muitas vezes serve apenas para prolongar a existência de empresas inviáveis, levantando dúvidas sobre fraudes e abusos.
Em junho, a Zapaz Administração Judicial, que auxiliou no processo de recuperação da AFG Brasil S.A., cujo plano de soerguimento foi homologado após alegar dívidas de R$ 648 milhões, também cobrou a falência do grupo.
Após diversos credores pedirem a falência da AFG argumentando que a empresa descumpriu o Plano de Recuperação, e o ministério público se manifestar favorável, a Zapaz, que administrou todo o processo, também reconheceu que a tentativa de resgate econômico-financeiro fracassou.
Para se ter uma ideia, a Zapaz anexou na manifestação que, em 2020, ano que a recuperação foi requerida, a AFG faturou mais de R$ 1 bilhão. Porém, em 2023, último exercício registrado, o faturamento foi de R$ 1.5 milhão, o que representou redução de 99,9%.
Atacadista do agro, a Anglopar acusa a AFG de falsificar documentos para adquirir a fazenda São Paulo por 17 milhões de dólares, e usar isso para obter ganhos escusos, que se transformara em mais dívida, impedindo o cumprimento de suas obrigações firmadas no plano.
Soma-se a isso o descumprimento reiterado das obrigações firmadas no plano, o declínio da situação financeira, os atrasos no pagamento dos funcionários, bem como a aparente inatividade empresarial, que foi evidenciada pela ausência de novos contratos e emissão de notas fiscais.
Os relatórios contábeis apresentados pela AFG também demonstraram tendência de declínio nos rendimentos da empresa ao longo dos últimos anos. Os índices estão diminuindo, indicando incapacidade de pagamento das dívidas, cumulado com o atraso de pagamento dos funcionários.
Então, para a administradora, o reiterado descumprimento das obrigações do plano, aliado aos fatores referidos, evidenciaram o estado delicado da AFG, que não tem mais condições de executar seu soerguimento econômico-financeiro. Diante disso, requereu a convolação da Recuperação Judicial da empresa AFG Brasil em falência.
Em outubro de 202, a 1ª Vara Cível de Cuiabá deferiu o processamento da recuperação judicial da AFG Brasil S/A, por dívidas de cerca de 648 milhões. A empresa, com sede em Cuiabá, alegou que a complicada situação fiscal do Brasil, somada à crise da Covid-19, que desvalorizou a moeda nacional, lhe trouxe impactos negativos.