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Não seja só mais um número entre milhares de casos na justiça

Lisiane V. Linhares Schmidel


Consultando a página do CNJ - Comissão Nacional de Justiça, podemos acessar os dados do Judiciário - Justiça em números (https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2020/08/WEB-V3-Justiça-em-Números-2020-atualizado-em-25-08-2020.pdf), onde consta que o tempo médio de duração de um processo judicial na Justiça comum, ou seja, a Justiça ligada às causas que afetam a maioria dos cidadãos comuns, é de cerca de cinco anos, quando não envolve interesse da Fazenda Pública, pois, neste caso, agrega-se mais dois anos a esta média.

Os Juizados Especiais, por sua vez, muito embora tenham sido criados como uma tentativa de reduzir o tempo de duração das demandas para causas com valor não superior ao teto de quarenta salários mínimos, tem se mostrado apenas uma extensão empobrecida do braço mais assoberbado da Justiça, amargando uma média de um ano de duração. Pode parecer rápido comparado à média das causas com valores superiores ou que envolvam direito de interesse público, mas ainda assim, não atinge sua proposta de criação.

Um cidadão que busca receber um crédito na justiça, presume-se já ter amargado a inadimplência por no mínimo três meses e já deve ter lançado mão de alguns recursos de cobrança, e ainda assim, terá de esperar uma média de sete anos para receber seu crédito, se receber. Isso porque as execuções extrajudiciais tem o maior tempo de duração. Então, coloque aí na conta, quase uma década.

Quanta coisa pode acontecer em cinco, sete anos? Vivemos uma realidade que se mostra totalmente inesperada em comparação à realidade de dois anos atrás em termos sociais e econômicos, e a vida não é estanque. Mas nosso judiciário quase o é.
É dizer que diante de um número superior a 20.000 (vinte mil) novos casos que chegam até a justiça todos os anos, as sentenças tem número semelhante, contudo, soma-se aos processos que já existem, em temos uma justiça, estamos a enxugar gelo.

Significa que a qualidade dos julgamentos tende a declinar vertiginosamente. Seja porque os juízes estão sempre às voltas de números, seja, porque a burocracia do judiciário emperra ainda mais o andamento dos processos, seja porque temos servidores cansados, entediados e desmotivados, pouco desafiados frente à certeza salarial e pouco resultado do seu trabalho, seja porque temos uma sociedade que ainda crer que levar suas questões à Justiça, sempre é o melhor caminho.

E o resultado disso são julgamentos pouco técnicos, com grande número de recursos e pior, de reformas das decisões, gerando uma insegurança jurídica sem precedentes, profissionais e partes estupefatos e insatisfeitos, e quando finalmente há um resultado dito como final, a efetivação do que se decidiu, é quase um troféu sem valor, ou, surge um novo conflito.

E assim as partes vão se desgastando e o senso de satisfação se torna cada vez mais um mero conformismo. UM “fazer o quê” sem fim. Um lamento irremediável.

A advocacia colaborativa rompe com esse ciclo vicioso. É imperioso se reconhecer que, as partes, na maioria as vezes, tem plena condição de negociar seus direitos e alcançar melhores condições, com resultados que serão mantidos ao longo do tempo, com uma maior segurança. As partes, orientadas por profissionais que estão em consonância com seus interesses, e não estão preocupados com metas, e sim com o resultado mais satisfatório possível, terão finalmente, senso de justiça e de satisfação com o resultado. Não se sentirão, ao contrário, punidas, ainda que tenham “ganhado" a causa.

Países como os EUA, sabem que conflitos levados à Justiça, somente se justificam após inúmeras tentativas entre as partes e seus representantes, de alcançarem a melhor solução, e usam de vários mecanismos interdisciplinares para isso. A Justiça é portanto, acessada, apenas em casos que realmente seja necessária a interferência do Estado, e até por isso, a qualidade do julgamento é melhor, os números são proporcionalmente menores e o ciclo virtuoso se instaura.

Precisamos reconhecer que por mais devotados que os magistrados possam ser, são seres humanos sujeitos a falhas, e quanto maior for o assoberbamento do judiciário, mais a sociedade será vítima de erros cada vez mais crassos. Sejamos colaborativos com o Judiciário, mas sobretudo, com nossos direitos.      
 
 
Lisiane V. Linhares Schmidel é advogada empresarial e colaborativa, sócia da Schmidel e Associados Advocacia e atual presidente da Comissão de Práticas Colaborativas da ABA/MT.
@praticascolaborativas_abamt  @lisianeschmidel.  
 
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